Tuesday, May 01, 2012

Afinidades, de Arthur da Távola

"A afinidade não é o mais brilhante, mas o mais sutil,
delicado e penetrante dos sentimentos.
O mais independente.

Não importa o tempo, a ausência, os adiamentos,

as distâncias, as impossibilidades.
Quando há afinidade, qualquer reencontro retoma a relação,
o diálogo, a conversa, o afeto, no exato ponto em que foi interrompido.
Afinidade é não haver tempo mediando a vida.

É uma vitória do adivinhado sobre o real.

Do subjetivo sobre o objetivo.
Do permanente sobre o passageiro.
Do básico sobre o superficial.
Ter afinidade é muito raro.

Mas quando existe não precisa de códigos verbais para se manifestar.

Existia antes do conhecimento, irradia durante e permanece depois
que as pessoas deixaram de estar juntas.
O que você tem dificuldade de expressar a um não afim, sai simples
e claro diante de alguém com quem você tem afinidade.

Afinidade é ficar longe pensando parecido a respeito dos mesmos

fatos que impressionam, comovem ou mobilizam.
É ficar conversando sem trocar palavra.
É receber o que vem do outro com aceitação anterior ao entendimento.

Afinidade é sentir com.

Nem sentir contra, nem sentir para, nem sentir por, nem sentir pelo.
Quanta gente ama loucamente, mas sente contra o ser amado.
Quantos amam e sentem para o ser amado, não para eles próprios.

Sentir com é não ter necessidade de explicar o que está sentindo.

É olhar e perceber.
É mais calar do que falar.
Ou quando é falar, jamais explicar, apenas afirmar.

Afinidade é jamais sentir por.

Quem sente por, confunde afinidade com masoquismo.
Mas quem sente com, avalia sem se contaminar.
Compreende sem ocupar o lugar do outro.
Aceita para poder questionar.
Quem não tem afinidade, questiona por não aceitar.

Só entra em relação rica e saudável com o outro,

quem aceita para poder questionar.
Não sei se sou claro: quem aceita para poder questionar,
não nega ao outro a possibilidade de ser o que é, como é, da maneira que é.
E, aceitando-o, aí sim, pode questionar, até duramente, se for o caso.
Isso é afinidade.
Mas o habitual é vermos alguém questionar porque não aceita
o outro como ele é. Por isso, aliás, questiona.
Questionamento de afins, eis a (in)fluência.
Questionamento de não afins, eis a guerra.

A afinidade não precisa do amor. Pode existir com ou sem ele.

Independente dele. A quilômetros de distância.
Na maneira de falar, de escrever, de andar, de respirar.
Há afinidade por pessoas a quem apenas vemos passar,
por vizinhos com quem nunca falamos e de quem nada sabemos.
Há afinidade com pessoas de outros continentes a quem nunca vemos,
veremos ou falaremos.

Quem pode afirmar que, durante o sono, fluidos nossos não saem

para buscar sintomas com pessoas distantes,
com amigos a quem não vemos, com amores latentes,
com irmãos do não vivido?

A afinidade é singular, discreta e independente,

porque não precisa do tempo para existir.
Vinte anos sem ver aquela pessoa com quem se estabeleceu
o vínculo da afinidade!
No dia em que a vir de novo, você vai prosseguir a relação
exatamente do ponto em que parou.
Afinidade é a adivinhação de essências não conhecidas
nem pelas pessoas que as tem.

Por prescindir do tempo e ser a ele superior,

a afinidade vence a morte, porque cada um de nós traz afinidades
ancestrais com a experiência da espécie no inconsciente.
Ela se prolonga nas células dos que nascem de nós,
para encontrar sintonias futuras nas quais estaremos presentes.
Sensível é a afinidade.
É exigente, apenas de que as pessoas evoluam parecido.
Que a erosão, amadurecimento ou aperfeiçoamento sejam do mesmo grau,
porque o que define a afinidade é a sua existência também depois.

Aquele ou aquela de quem você foi tão amigo ou amado, e anos depois

encontra com saudade ou alegria, mas percebe que não vai conseguir
restituir o clima afetivo de antes,
é alguém com quem a afinidade foi temporária.
E afinidade real não é temporária. É supratemporal.
Nada mais doloroso que contemplar afinidade morta,
ou a ilusão de que as vivências daquela época eram afinidade.
A pessoa mudou, transformou-se por outros meios.
A vida passou por ela e fez tempestades, chuvas,
plantios de resultado diverso.

Afinidade é ter perdas semelhantes e iguais esperanças,

é conversar no silêncio, tanto das possibilidades exercidas,
quantos das impossibilidades vividas.

Afinidade é retomar a relação do ponto em que parou,

sem lamentar o tempo da separação.
Porque tempo e separação nunca existiram.
Foram apenas a oportunidade dada (tirada) pela vida,
para que a maturação comum pudesse se dar.
E para que cada pessoa pudesse e possa ser, cada vez mais,
a expressão do outro sob a forma ampliada e
refletida do eu individual aprimorado."

Encontrei esta fala que retrata um pouco do que penso acerca de pessoas com as quais encontro e com as quais tenho a plena certeza de que já as encontrei e com elas me relacionei mesmo sem nunca ter com elas convivido um dia sequer, tamanha a afinidade que temos no que fazemos, nas ideias que povoam nossa mente ou em entender o que o outro pensa apenas com o olhar...

Monday, March 26, 2012

Em 2012 tenho tido oportunidade de abraçar uma nova causa: o Ensino Médio Politécnico. Muitas têm sido as críticas quanto a implantação desta nova metodologia. Penso que a metodologia de projetos de aprendizagem deveria ser utilizada desde que os pequenos entram pela primeira vez no ambiente escolar. Como não é assim que funciona, temos agora uma imposição do governo do RS que implanta em todo o Ensino Médio  da rede estadual esta nova Lei.

Trabalho na coordenação da EEEM La Salle e desde a graduação que fiz EAD pela UFRGS sou apaixonada pelas perguntas e pesquisas realizadas pelos meus alunos que ao final as apresentam com tanto entusiasmo e orgulho pela construçaõ do próprio conhecimento que me deixam emocionada.

Atualmente trabalho com os professores tentando mostrar a eles esta nova possibilidade que está sendo oferecida e que com certeza nos renderá bons frutos. Teremos dificuldades sim, porque nossos alunos vêm estudando todos os anos individualmente, sentados de frente para o professor de maneira a ouvir e aprender tudo que o professor precisa explicar. Com a nova metodologia o aluno passa a ser agente transformador através da sua própria busca pelo conhecimento sob a orientação do professor.

Os professores têm socializado experiências, vontades, ideias, angústias e principalmente estão dispostos a lutar pela continuidade ou pelo recomeço na construçao dos projetos dos alunos. Sabemos que precisamos semear nossas sementinhas de valorização da educação que muitas vezes são sufocadas pelas ervas daninhas que tentam minar uma educação que liberta e dá autonomia aos cidadãos porque eles certamente vão aprender a duvidar e questionar e possivelmente investigar tantos desvios e falcatruas que vimos diariamente ser noticiadas com direito a filme e foto, evidências que colocariam qualquer ladrão de galinha atrás das grades mas que por conchavos politicopartidários acabam sendo colocados embaixo de panos quentes.

Estamos caminhando por uma estrada que não conhecemos tanto assim, mas na Escola La Salle vamos juntos, lado a lado, opinando, nos equivocando e aparando arestas. Assim, tenho certeza que vamos vislumbrar um horizonte claro, verdejante, iluminado pelo progresso mas sustentado numa metodologia que realmente faça dos nossos alunos cidadãos que façam a diferença neste mundo que tanto necessita de pessoas curiosas e comprometidas com a construção de um mundo melhor.